III
Ouço a campainha tocar. São seis da tarde. Levanto-me da cama.
- Abre-me a porta! - a voz dela é firme.
Carrego no interruptor e abro a porta de entrada. Volto para o quarto. Acendo um cigarro. Ouço-a entrar, batendo a porta.
- Quem é que pensas que és? Primeiro, está tudo bem. Depois, aparece uma rapariga qualquer a falar do irmão e dos pais. A seguir desapareces. Tento ligar-te, falar contigo e tu, nada. Agora chego aqui e vejo-te nesse estado deplorável. Ah, e pensei que tinhas deixado de fumar! - a ironia da última frase passa-me ao lado.
Apesar de ser a pior altura de todas, decido contar-lhe tudo. Mais para contar a alguém do que com a esperança de reatar a relação.
- Aquela que tu viste, - as palavras saem-me frias, sem emoção - chama-se Joana, e é irmã do meu melhor amigo. Quando me conheceste, disseste que eu era sombrio, pois bem, um mês antes ele tinha morrido. - acho que ainda não tinha dito isto a ninguém.
- Mas, o que é que aconteceu?
Ela quer saber tudo. Tenho de contar.
- Nós os dois tínhamos ido sair, e bebemos uns copos. Estava a chover bastante. Ele disse que conduzia, mas estava em pior estado que eu. O carro derrapou e embatemos contra uma árvore. Eu perdi os sentidos e quando acordei vi-o morto a meu lado. Ainda tinha os olhos abertos. Esses olhos aparecem-me todas as noites em pesadelos. - tremo, ao viver tudo de novo.
- Eu compreendo que te sintas em baixo, mas tens de continuar. Não me digas que achas que foi culpa tua? - a pergunta sai de surpresa.
- Mas é culpa minha! Eu sei que ele conduzia melhor que eu, mas nunca devia ter deixado que ele conduzisse. Nós fizemos isso vezes sem conta, eu devia ter previsto. Eu devia ter imaginado… A Joana tem razão! - enterro a cabeça nas mãos.
- Tem razão, o tanas! É verdade que foi uma inconsciência, mas se estavam os dois bêbados, só podiam era não ter pegado no carro. Não interessa quem ia a conduzir. - a lógica dela não é a minha.
- Não! Eu devia ter insistido, eu devia tê-lo mandado parar. A culpa foi minha! - as palavras da Joana, o olhar dela, a imagem dos pais dele no funeral, nada me sai da cabeça.
- Só podes estar a brincar! A culpa é tua?! Essa explicação não tem pés nem cabeça. Sé sentes culpa porque ele morreu e tu sobreviveste. E isso não tem lógica. É claro que foi mau ele ter morrido, mas tu não podes viver assim o resto da tua vida. Ele não ia querer isso, eu não quero isso. Não consigo viver com alguém que não quer viver. Disse-te que me apaixonei por ti porque adoras a vida. Não vou agora dizer que deves viver agarrado à morte. Tens de escolher se queres viver comigo ou agarrado ao fantasma dele. - sempre firme, sempre decidida.
Para ela não pode haver meias medidas, ou sim ou não, ou preto ou branco. Eu também era assim, directo, sem hesitações. Mas aquilo mudou tudo.
- A culpa foi minha! Não entendes? Ele era inteligente, divertido, cheio de vida, toda a gente gostava dele. Era eu que devia ter morrido… - não sei se sinto mesmo o que digo ou se a quero mandar embora.
- Tenho pena que sintas isso. Sabes porquê? Porque quer dizer que no acidente não morreu apenas o teu melhor amigo. Morreram os dois!
Estou de costas para ela e as palavras ecoam nos meus ouvidos. Pressinto-a a ir embora e ouço a porta a bater com estrondo.
Ouço a campainha tocar. São seis da tarde. Levanto-me da cama.
- Abre-me a porta! - a voz dela é firme.
Carrego no interruptor e abro a porta de entrada. Volto para o quarto. Acendo um cigarro. Ouço-a entrar, batendo a porta.
- Quem é que pensas que és? Primeiro, está tudo bem. Depois, aparece uma rapariga qualquer a falar do irmão e dos pais. A seguir desapareces. Tento ligar-te, falar contigo e tu, nada. Agora chego aqui e vejo-te nesse estado deplorável. Ah, e pensei que tinhas deixado de fumar! - a ironia da última frase passa-me ao lado.
Apesar de ser a pior altura de todas, decido contar-lhe tudo. Mais para contar a alguém do que com a esperança de reatar a relação.
- Aquela que tu viste, - as palavras saem-me frias, sem emoção - chama-se Joana, e é irmã do meu melhor amigo. Quando me conheceste, disseste que eu era sombrio, pois bem, um mês antes ele tinha morrido. - acho que ainda não tinha dito isto a ninguém.
- Mas, o que é que aconteceu?
Ela quer saber tudo. Tenho de contar.
- Nós os dois tínhamos ido sair, e bebemos uns copos. Estava a chover bastante. Ele disse que conduzia, mas estava em pior estado que eu. O carro derrapou e embatemos contra uma árvore. Eu perdi os sentidos e quando acordei vi-o morto a meu lado. Ainda tinha os olhos abertos. Esses olhos aparecem-me todas as noites em pesadelos. - tremo, ao viver tudo de novo.
- Eu compreendo que te sintas em baixo, mas tens de continuar. Não me digas que achas que foi culpa tua? - a pergunta sai de surpresa.
- Mas é culpa minha! Eu sei que ele conduzia melhor que eu, mas nunca devia ter deixado que ele conduzisse. Nós fizemos isso vezes sem conta, eu devia ter previsto. Eu devia ter imaginado… A Joana tem razão! - enterro a cabeça nas mãos.
- Tem razão, o tanas! É verdade que foi uma inconsciência, mas se estavam os dois bêbados, só podiam era não ter pegado no carro. Não interessa quem ia a conduzir. - a lógica dela não é a minha.
- Não! Eu devia ter insistido, eu devia tê-lo mandado parar. A culpa foi minha! - as palavras da Joana, o olhar dela, a imagem dos pais dele no funeral, nada me sai da cabeça.
- Só podes estar a brincar! A culpa é tua?! Essa explicação não tem pés nem cabeça. Sé sentes culpa porque ele morreu e tu sobreviveste. E isso não tem lógica. É claro que foi mau ele ter morrido, mas tu não podes viver assim o resto da tua vida. Ele não ia querer isso, eu não quero isso. Não consigo viver com alguém que não quer viver. Disse-te que me apaixonei por ti porque adoras a vida. Não vou agora dizer que deves viver agarrado à morte. Tens de escolher se queres viver comigo ou agarrado ao fantasma dele. - sempre firme, sempre decidida.
Para ela não pode haver meias medidas, ou sim ou não, ou preto ou branco. Eu também era assim, directo, sem hesitações. Mas aquilo mudou tudo.
- A culpa foi minha! Não entendes? Ele era inteligente, divertido, cheio de vida, toda a gente gostava dele. Era eu que devia ter morrido… - não sei se sinto mesmo o que digo ou se a quero mandar embora.
- Tenho pena que sintas isso. Sabes porquê? Porque quer dizer que no acidente não morreu apenas o teu melhor amigo. Morreram os dois!
Estou de costas para ela e as palavras ecoam nos meus ouvidos. Pressinto-a a ir embora e ouço a porta a bater com estrondo.
(continua)
3 comentários:
daqui a nada, faço daqueles baldes de pipocas enquanto estiver a ler a tua história....;)
ah e tal, já la iam uns tempos que não via a menina aqui...:P
Beijo
sou um bocado imprevisivel...;P
beijinho
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