terça-feira, fevereiro 19, 2008

O mundo jornalista...

É talvez o meu cronista preferido e nunca é tarde para dar os parabéns de um prémio. Fiquem com excertos das suas crónicas recentes!

YSL
"Nunca deixei de o ver como um escritor. E, por muito longe que o seu trabalho possa parecer das palavras, nunca o separei da escrita. Ele vê cada pessoa como se fosse o mundo inteiro, e é nessa situação que se apropria dela", escreveu Marguerite Duras. Em 2002, ao despedir-se do ofício, como quem de si se despede, citou Rimbaud ("os fazedores do fogo") e Proust ("a magnífica e lamentável família dos nervosos é o sal da terra"), dizendo palavras certas sobre o triunfo e a derrota. (...) Depressivo, atormentado, nervoso (Bergé disse que ele nasceu com um ataque de nervos), deu-se a todos os demónios e entregou as virtudes a todos os vícios (álcoois, drogas, cigarros, refrigerantes): "Passei por muitas angústias, às vezes por infernos. Conheci o medo e a terrível solidão, os falsos amigos que são os tranquilizantes e os estupefacientes. A prisão da depressão e das clínicas." O adolescente frágil e fugidio tornou-se um velho triste e trôpego, a que os óculos antigos dão um ar de outro tempo. Dizem que, agora, escreve muito. Talvez tenha descoberto que, escrevendo, podemos agarrar o que nos foge... "

Arnaldo
"As cidades têm as suas epilepsias. Durante anos, a epilepsia de Lisboa era a aparição dele. Em paragens rápidas e passadas largas, percorria o Rossio e o Chiado, atroando o ar com a voz dos seus gestos e os gestos da sua voz. Havia nele fúria, ameaça e castigo. Entrava nos cafés (Nicola, Café Chiado, Brasileira), gritava o que tinha a gritar e saía ainda mais veemente, prosseguindo a sua imprecação contra os homens. As pessoas ficavam estupefactas. Num país que falava em voz baixa, aquele cume verbal intimidava. Para mais, ele exibia-se: calçava sapatos de verniz e vestia jaquetão com camisa branca e calças de fantasia. A gravata clara de cetim com uma pérola e a flor na lapela davam-lhe um ar nupcial. Passou, por isso, a correr na cidade aturdida pelos seus brados uma história que assim contava: no dia do casamento, quando esperava a noiva no altar, foi-lhe dada a notícia de que morrera. Noutra versão, menos "à Soares de Passos", ela estava viva, mas não apareceu. Essa morte ou essa recusa tinha-o endoidecido, e uma psicanálise popular via na obsessão pelo traje nupcial a fixação àquele momento trágico em que lhe fora negado o casamento e a felicidade. Chamavam-lhe, por isso, o "sempre noivo"."

Assim vai o mundo...

2 comentários:

Maria disse...

O sempre noivo... muito romântico e por isso mesmo pouco prático...

Francisco del Mundo disse...

maria, gostava de conhecer a personagem...:D
Beijo